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terça-feira, 11 de março de 2008

DISCURSO DO PRIMEIRO - MINISTRO FRANCÊS...


Discurso do Primeiro-Ministro francês,
François Fillon,
perante o Instituto de Altos Estudos da Defesa Nacional

Paris, 21 de fevereiro de 2008


Senhores Parlamentares,
Senhor Chefe do Estado Maior das Forças Armadas,
Senhor Secretário-Geral da Defesa Nacional,
Senhores Oficiais Gerais,
Senhoras e Senhores Auditores,

Se fiz questão de recebê-los em Matignon foi não só porque sou “responsável pela Defesa Nacional” de acordo com a Constituição, mas, sobretudo, porque sou, como os Senhores, apaixonado por questões ligadas à defesa e à estratégia e isso há muito tempo.

Na Assembléia Nacional, tive a honra de ser eleito ainda muito jovem para presidência da Comissão da Defesa e das Forças Armadas. Aliás, foi nessa época que escrevi um de meus primeiros artigos sobre o futuro do exército, um artigo do qual pode-se dizer que percorreu um bom caminho, já que pedia a profissionalização das forças armadas, conforme implementou Jacques Chirac, 15 anos mais tarde!

Quanto mais se profissionaliza o exército, mais é preciso estreitar seus laços com a nação. E o IHEDN é, há 60 anos, a instituição fundamental para essa aproximação. Tive o prazer de ser um de seus auditores. Entre a 37ª e a 60ª sessão, quantos transtornos no contexto geoestratégico! A bipolarização é a morte. A globalização impôs-se, criando, num movimento paradoxal, uma ampla interdependência do sistema internacional e uma série de fissuras e fricções. Os centros de gravidade econômicos e demográficos do mundo deslocaram-se para a Ásia, cuja população deverá ainda dobrar até 2050.

Novas linhas de fraturas surgiram:
- fratura entre o Norte e o Sul. Seria necessário lembrar que cinco países concentram dois terços da riqueza mundial?
- fratura entre os países detentores de recursos naturais e os países industrializados. É evidente para a União Européia, cuja metade das necessidades energéticas estão cobertas por produtos importados, e se nada for feito, serão dois terços em 2020.

Nesse mundo incerto, o futuro, Senhoras e Senhores, não pertence às nações imóveis. Há nove meses, juntamente com o Presidente da República, todo o sentido de nossa ação converge para nossa necessária recuperação. Essa recuperação é ilustrada, em níveis econômico e social, pela intensa atividade reformadora que temos empreendido em todas as áreas. Por que falo de recuperação? Porque nosso país recusou-se a ver que nosso mundo mudou, recusou-se a ver que um bilhão de chineses e um bilhão de indianos haviam decidido mudar. Ela é ilustrada pela ratificação do Tratado de Lisboa, pois a França tinha que fazer com que a União saísse de sua crise institucional na qual tínhamos a nossa parcela de responsabilidade. Ela é ilustrada pela iniciativa do Presidente com relação à aproximação das duas margens do Mediterrâneo. Ela é ilustrada através de um diálogo equilibrado com os Estados Unidos. Ela é ilustrada enfim pela nossa vontade de fazer com que avance a política externa e de defesa européia.

Nos próximos meses, vamos tirar partido de todas as oportunidades que se apresentam a nós para tomarmos iniciativas. A presidência da União Européia a partir de 1º de julho vai nos fornecer essa oportunidade. Existe a questão da segurança de nosso abastecimento em matéria energética. Existe a questão da imigração, que exige uma abordagem comum diante dos fluxos migratórios. Existe a luta contra a mudança climática. E depois, existe a retomada da defesa européia. Em suma, a França está em movimento e, ao fazê-lo, ela se expõe, e não é aos Senhores que lembrarei esse princípio básico do combate tático: quem se mexe, fica a descoberto.

Quanto mais a França se engaja, mais ela oferece o flanco a revides ou atos hostis. Quanto mais a França se abre ao comércio internacional, mais ela é sensível às flutuações da economia mundial. Quanto mais nossa produção aumenta, mais dependemos dos abastecimentos energéticos e das matérias primas. Quanto mais nossas metrópoles concentram atividade, mais elas aparecem como alvos. Quanto mais nos tornamos uma economia em rede, mais somos dependentes de infra-estruturas – de transportes, comunicação, energia – que não foram especialmente concebidas para resistir a novos riscos como o terrorismo e os ciber-ataques. Quanto mais nossa qualidade de vida e nosso modelo social são atraentes, mais personificarmos a esperança para milhões de migrantes que não poderemos acolher. Quanto mais estivermos à frente nos setores estratégicos como o espacial, o digital ou o nuclear, mais vulneráveis ficamos às ações adversas de inteligência econômica. Devemos assumir todos esses riscos e nos preparar para eles.

Senhoras e Senhores,

Não se deve acreditar que o mundo tenha deixado de ser perigoso. Os perigos estão apenas mais difusos, mais obscuros, menos identificáveis do que antigamente. Não temos mais inimigos “hereditários”. Nem assim a guerra desapareceu e a História terminou.

O Presidente da República decidiu redigir um novo livro branco e uma nova lei de programação, que será votada antes do verão. O último livro branco data de 1994. Vivíamos o momento imediatamente seguinte ao desaparecimento do Pacto de Varsóvia. Nossa herança conceitual e intelectual ainda estava marcada por décadas de tensões continentais. A profissionalização das forças mal começava a gerar o debate. Em janeiro de 2003, a Lei de Programação Militar, por sua vez, fazia entrar a profissionalização nos fatos, mas não se percebia totalmente o fim da guerra fria. Essa hesitação traduzia-se por uma dupla conseqüência: uma programação militar muito ambiciosa a serviço de um instrumento de defesa amplamente concebido para responder a um confronto de alta intensidade, no final das contas, clássico.

Hoje, o jogo mudou e nós queremos extrair disso as lições. O livro branco e a lei de programação em fase de preparação têm por objetivo responder a três desafios:
- o desafio de uma segurança, agora mais global;
- o desafio da interdependência do sistema energético marcado por um distanciamento dos teatros de operação e a duração das crises e conflitos;
- o desafio, por fim, da realidade, especialmente a orçamentária.

Nossa defesa e nossa segurança repousam em quatro pilares: dissuasão, projeção, antecipação, proteção.

Dissuasão nuclear: ela continua sendo a derradeira garantia de nossa segurança e deve ser transformada em zona protegida.

Projeção: nossas forças armadas devem ser capazes de intervir em todos os locais. Dessa capacidade dependerá diretamente nossa influência na resolução das crises.

Antecipação: para agir rapidamente e de forma exata, é preciso saber e prever. Para isso, temos que dispor de uma informação ainda mais eficiente e mais diversificada.

Quanto à proteção às populações, quero insistir na necessidade de aumentarmos nossa “resiliência”, ou seja, a capacidade de nosso país de sobreviver aos ataques que sofre. Para isso, devemos integrar a consideração das ameaças desde a etapa da concepção das infra-estruturas. É preciso que elas sejam mais resistentes, mas também mais redundantes para evitar que uma falha paralise toda a rede.

Convém igualmente planejarmos nossas medidas de proteção e os exercícios referentes a essas ameaças. Refiro-me, por exemplo, ao plano contra a pandemia de gripe, que necessita a criação de estoques estratégicos de medicamentos e combustíveis. É evidente que se trata de um dossiê de âmbito europeu, visto que as redes de abastecimento e de transporte estão conectadas.

Todo mundo sente bem que os desafios de defesa e de segurança são cada vez mais ligados e complementares. Exército e forças de segurança devem portanto, preservando suas próprias identidades, melhorar sua aptidão para trabalhar juntos.

Dissuasão, projeção, antecipação, proteção: defender-se é um dever, mas prevenir os conflitos é de uma outra essência, uma essência política.

A França sempre estará do lado do direito internacional e militará por um reforço dos instrumentos. Mais do que nunca, nosso mundo precisa de equilíbrio e o equilíbrio exige legitimidade na decisão e colegialidade, se possível, na ação.

A França dá ênfase prioritariamente a quatro meios:
1) o reforço das organizações internacionais e, em particular, da ONU. A ampliação do Conselho de Segurança desejada pelo Presidente da República e o aprimoramento da capacidade da ONU para administrar as crises sempre terão o apoio de nosso país;
2) a mobilização da União Européia em torno de desafios compartilhados;
3) uma participação construtiva no seio da OTAN, ligada aos progressos da defesa européia;
4) o desenvolvimento das cooperações bilaterais ou multilaterais ad hoc. É o que estamos fazendo no Chade, para garantir a segurança dos campos de refugiados do Darfur, com a instalação da operação Eufor Chade-RCA.

As atuais reflexões a respeito de nossa defesa nacional dão um amplo espaço à dimensão humana da Defesa. Isto é mais do que justificado. Com a transformação dos conflitos em guerrilha e terrorismo, as forças armadas e de segurança estão cada dia mais expostas a novas formas de agressão. Os homens e mulheres que se engajaram nessas operações estão expostos a riscos que podem levá-los até o sacrifício derradeiro. Eles o fazem com conhecimento de causa, com uma coragem e uma abnegação excepcionais. Servem ao seu país com honra e não devem ser esquecidos, porque combatem ao longe. Eles merecem nossa gratidão e eu faço questão de manifestar-lhes o reconhecimento da Nação.

O elo que une a nação ao seu exército é vital. Estou convencido disso. É preciso haver uma cultura coletiva de defesa e segurança, pois a proteção da Nação é assunto de todos. Cada francês deve se sentir implicado.

Os Senhores são os embaixadores dessa adesão. Com a sessão nacional e a rede das 38 outras associações, o IHEDN constitui um verdadeiro “exército de reserva intelectual” constituído de 10.000 pessoas, baseado na França e no exterior. Seu compromisso a serviço do interesse geral merece um agradecimento por seu justo valor. E seu potencial merece ser ainda mais explorado, em primeiro lugar, fazendo com que o auditor torne-se um ator, para além de seu papel de transmissor de opinião. E sei que IHEDN trabalha nisso.

Em seguida, através da difusão do espírito de defesa no ensino e na formação. Penso aqui na educação nacional, nos trinômios acadêmicos e na rede de inteligência econômica. Este é o objeto do 4ª protocolo assinado entre os ministérios envolvidos e que entrou em aplicação no segundo semestre de 2007.

Por fim, buscando as sinergias entre todos os institutos que tratam de defesa e segurança. Esta é a missão que o Presidente da República e eu mesmo confiamos a Alain Bauer e que resultará, dentro de alguns dias, na especificação das missões e dos institutos.

Aí estão, Senhoras e Senhores, as reflexões que eu queria compartilhar com os Senhores. Eu o fiz com o sentimento de estar, juntamente com os Senhores, no centro de nossa causa comum: a liberdade e a grandeza da França.

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