quinta-feira, 19 de junho de 2008
O RETRATO DE 1963
O RETRATO DE 1963
Waldo Luís Viana*
(* Waldo Luís Viana é escritor, economista, jornalista e poeta).
Em 1963, tinha oito anos. Só vi o QG do Exército na Avenida Presidente
Vargas, no Rio de Janeiro, sitiado por fotografia. Não sabia que viria uma
negra ditadura. Gostava de jogar botão e bola de gude e já, em tenra idade
de sabedoria, torcia pelo Flamengo.
O general Castelo Branco jogou o país em grave recessão, comandada pelo
monetarismo de Roberto Campos e pelo Banco Central do Dênio Nogueira, seu
primeiro presidente, que conheci quarenta anos mais tarde. Doei-lhe sangue,
porque ele teve câncer na próstata, mas ele morreu logo depois e vivia em
casa alugada. Eram outros tempos...
64 sucedeu 63 e o Sr. João Goulart fez um comício na Central do Brasil, para
mostrar força e coragem, enquanto a hierarquia nas Forças Armadas era
desintegrada por marinheiros e sargentos. Só faltava o Encouraçado de
Potenkin ancorar nas águas cálidas da Guanabara.
Era menino, mas não agüentava minha avó dizendo a meu pai que a estrela que
iluminou Getúlio era a mesma estrela que indicou Jesus. E ele redargüia, ao
contrário, que havia esperança, porque Lacerda chegaria à presidência da
República. Logo depois veio o tal de Geisel, e eu era maiorzinho, e com a
espada de bárbaro e a operação Condor, mandando liquidar o próprio Jango, o
Lacerda e o Juscelino. Brizola só escapou porque aceitou o colinho de Jimmy
Carter. E conseguiu voltar, depois, com a anistia.
O Brasil não é coisa pra menino. Dizer para um historiador de Harvard que
Lula é cria do general Golbery e da esquerda católica, que ele já traiu,
deixa qualquer gringo fora do ar. Parabéns Golbery, você destruiu Brizola,
dividiu a esquerda e lançou o país na pré-atmosfera de uma ditadura cubana.
Lembrem-se, a primeira audiência de Lula foi para o coronel Chávez, que
chegou atrasado. A última talvez seja interrompida por coronéis brasileiros,
que chegarão mais cedo...
Mas ontem vi o QG sagrado do Exército sitiado por moradores da favela da
Providência. Não importa o motivo, importa o símbolo. Lula acha que o seu
poder está nos sindicatos e no movimento social, pisa na oficialidade de
baixo, do mesmo modo como concede migalhas a seus proletários. O Exército
brasileiro tem a cara e as contradições do país. Mas é patriota. Não é
comensal de Cuba, do Haiti, nem dos Estados Unidos.
Lula pensa que é comandante em chefe, mas não sabe nem bater “continença”.
Nem sabe o que é isso, porque é o único analfabeto no mundo que deu certo.
Mas não será eternamente. Se ele pensa que os generais que vivem com as
comissões de Brasília representam a realidade da tropa, ele, o nosso Guia,
está muito enganado. A Abin, enquanto escuta as peripécias dos ladrões do
governo, não percebe que a oficialidade não está calma, nem tampouco
ausente. Hoje, todo mundo tem computador e se corresponde. Até gente
importante me lê. E responde.
O QG do Exército, em novembro de 1955 ia ser alvejado pelo Tamandaré, um
cruzador da Marinha. Meu pai ligou pra minha mãe, ele era
jornalista, e eu estava num bercinho e ela me escondeu numa fresta do
escritório da casa, sabe se lá se a bala de canhão fosse perdida?
Pois Jango se foi, foi-se a ditadura, restabelecemos a democracia, Collor
foi impedido por causa de um Fiat Elba, fomos governados por um imperador
poliglota, um Kerensky que nos jogou nos braços do mais torpe governante que
nunca neste país tivemos. Um sindicalista, sem qualquer ideologia a não ser
a da permanência eterna no poder, aliado ao neoliberalismo da finança
internacional e ao socialismo violento das FARCs, Foros de São Paulo, MSTs e
Vilas Campesinas da vida, encarregados de destruir as instituições de
excelência que ainda temos no Brasil.
Mas a maior obra, além de doar pedaços da nação a índios educados na
Inglaterra, é a destruição das Forças Armadas, porque este enorme país não
precisa de bomba atômica. Ela só é necessária no Paquistão e na Índia. Aqui
tem samba, carnaval, Gilberto Gil e Pelé e outros falsos afro-descendentes.
Domingão do Faustão, Bispo Macedo, Sílvio Santos e o que mais? A ação está
completa. Êta povinho bom?
Sou um idiota por estar dizendo tudo isso. Mas não mexam com o Exército, ó
petistas, porque vocês irão se dar mal. Washington Luís jantava com o
ministro da Guerra e foi interrompido por um assessor que lhe informava
sobre uma provável sedição nas Forças Armadas. Disse ao amigo que se
retirasse porque estava jantando com o Ministro da Guerra. Foi deposto no
dia seguinte.
Pois a vida é assim. Lula está forte e tão prestigiado quanto Dunga. A
inflação voltou e os bancos vão começar a cobrar os créditos que concederam.
Traficantes e milicianos da polícia continuam estocando armas e o crime
continua a governar, por celular, das penitenciárias de segurança máxima. Os
desembargadores continuam recebendo o seu rico dinheirinho no guichê dos
bancos, mas a sopa pode acabar.
Mas não mexam com o Exército, porque eu, menino, lembro-me nitidamente do
retrato de 1963.
* Waldo Luís Viana é escritor, economista, jornalista e poeta.
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