A questão Raposa Serra do Sol
MOZARILDO CAVALCANTI, Senador por Roraima
A demarcação contínua e excludente da reserva indígena Raposa Serra do Sol em Roraima tem gerado grandes discussões em todos os segmentos da sociedade. Além de se tratar de uma área com quase 2 milhões de hectares, maior que o estado de Sergipe, onde vivem pouco mais de 10 mil índios completamente integrados à sociedade, a questão na Raposa Serra do Sol é muito mais complexa, pois está em uma área de fronteira com a Venezuela e com a Guiana, países que têm conflito territorial justamente onde se localiza a referida área indígena.
Antes da homologação da demarcação da reserva indígena, ocorrida em 2005, o Senado Federal e a Câmara dos Deputados, por meio de Comissões Temporárias Externas sobre Demarcação de Terras Indígenas, realizaram estudos, visitas in loco e audiências públicas no estado de Roraima e no Congresso Nacional, em face das enormes tensões sociais já existentes em torno da área Raposa Serra do Sol. Essas comissões entregaram ao presidente da República relatório com inúmeras recomendações a respeito da área indígena, propondo demarcação capaz de não gerar conflitos.
Algumas das recomendações com relação à reserva, que não foram levadas em conta pelo presidente Lula quando as homologou, referiam-se à exclusão das estradas estaduais e federais presentes na área: RR-171, RR-407, RR-319, BR-433, BR-401, permitindo-se o livre trânsito nas referidas vias; exclusão da área da unidade de conservação ambiental Parque Nacional Monte Roraima; também deveriam ficar de fora a sede do município de Uiramutã e das vilas de Água Fria, Socó, Vila Pereira e Mutum e respectivas zonas de expansão; a exclusão de áreas necessárias à exploração econômica, as áreas tituladas pelo Incra e aquelas referentes a imóveis com propriedade ou posse anterior ao ano de 1934; além da exclusão da faixa de 15 quilômetros ao longo da fronteira do Brasil com a Guiana e a Venezuela, e a convocação do Conselho de Defesa Nacional para opinar sobre o efetivo uso das áreas localizadas na faixa de fronteira (art. 20, § 2º, da Constituição de 1988).
Ressalte-se que tais conclusões foram relatadas em ambas as casas legislativas, de maneira insuspeita, por parlamentares do partido do presidente, o que demonstra que a decisão do presidente da República nem mesmo considerou a opinião da Câmara e do Senado. É sabido que a demarcação da Reserva Raposa Serra do Sol sempre foi nebulosa, razão pela qual se arrasta há tantos anos.
Nota-se claro descompasso entre a atuação das autoridades federais e das autoridades estaduais e municipais, principalmente quanto às possibilidades de desenvolvimento do estado. Há também disputas entre segmentos religiosos, além das reivindicações dos produtores rurais e dos proprietários com títulos oficiais emitidos há décadas. Some-se a isso o fato de que grande parte da reserva constitui área de fronteira, ameaçando a soberania nacional.
A Justiça Federal de Roraima, por meio de comissão de peritos, detectou inúmeras fraudes no laudo antropológico que serviu de base para a homologação, que vão desde motoristas assinando como técnicos agrícolas até o aumento injustificado da área, unindo as comunidades da Raposa (ao sul) e da Serra do Sol (ao norte), que ficam a quase 200 quilômetros de distância uma da outra, além de serem de etnias diferentes. Além disso, o mesmo laudo foi tomado como base para justificar tanto a demarcação contínua quanto a não contínua, permitindo interpretações subjetivas.
Ademais, há. Tais interpretações vêm sendo desprezadas pelos sucessivos laudos antropológicos. Soma-se a isso o grave problema social gerado pela forma excludente da demarcação, desterrando mais de 400 famílias que vivem ali há décadas, em sua grande maioria miscigenada. Há casos inclusive de famílias que foram divididas pelo apartheid social e étnico gerado pela decisão do governo federal.
No entanto, está claro que não haverá solução definitiva e pacífica até que o Supremo Tribunal Federal julgue as ações que tramitam naquela corte. A solução está em buscar uma proposta que respeite a soberania nacional e o direito à autonomia de todas as tribos indígenas da área Raposa Serra do Sol, garantindo as condições para o contato fraterno entre os povos Ingarikó, Makuxi, Patamona, Taurepang e Wapixana e a população não índia, mestiça ou cabocla e outros brasileiros.
(Correio Braziliense, 02/06/2008)
MOZARILDO CAVALCANTI, Senador por Roraima
A demarcação contínua e excludente da reserva indígena Raposa Serra do Sol em Roraima tem gerado grandes discussões em todos os segmentos da sociedade. Além de se tratar de uma área com quase 2 milhões de hectares, maior que o estado de Sergipe, onde vivem pouco mais de 10 mil índios completamente integrados à sociedade, a questão na Raposa Serra do Sol é muito mais complexa, pois está em uma área de fronteira com a Venezuela e com a Guiana, países que têm conflito territorial justamente onde se localiza a referida área indígena.
Antes da homologação da demarcação da reserva indígena, ocorrida em 2005, o Senado Federal e a Câmara dos Deputados, por meio de Comissões Temporárias Externas sobre Demarcação de Terras Indígenas, realizaram estudos, visitas in loco e audiências públicas no estado de Roraima e no Congresso Nacional, em face das enormes tensões sociais já existentes em torno da área Raposa Serra do Sol. Essas comissões entregaram ao presidente da República relatório com inúmeras recomendações a respeito da área indígena, propondo demarcação capaz de não gerar conflitos.
Algumas das recomendações com relação à reserva, que não foram levadas em conta pelo presidente Lula quando as homologou, referiam-se à exclusão das estradas estaduais e federais presentes na área: RR-171, RR-407, RR-319, BR-433, BR-401, permitindo-se o livre trânsito nas referidas vias; exclusão da área da unidade de conservação ambiental Parque Nacional Monte Roraima; também deveriam ficar de fora a sede do município de Uiramutã e das vilas de Água Fria, Socó, Vila Pereira e Mutum e respectivas zonas de expansão; a exclusão de áreas necessárias à exploração econômica, as áreas tituladas pelo Incra e aquelas referentes a imóveis com propriedade ou posse anterior ao ano de 1934; além da exclusão da faixa de 15 quilômetros ao longo da fronteira do Brasil com a Guiana e a Venezuela, e a convocação do Conselho de Defesa Nacional para opinar sobre o efetivo uso das áreas localizadas na faixa de fronteira (art. 20, § 2º, da Constituição de 1988).
Ressalte-se que tais conclusões foram relatadas em ambas as casas legislativas, de maneira insuspeita, por parlamentares do partido do presidente, o que demonstra que a decisão do presidente da República nem mesmo considerou a opinião da Câmara e do Senado. É sabido que a demarcação da Reserva Raposa Serra do Sol sempre foi nebulosa, razão pela qual se arrasta há tantos anos.
Nota-se claro descompasso entre a atuação das autoridades federais e das autoridades estaduais e municipais, principalmente quanto às possibilidades de desenvolvimento do estado. Há também disputas entre segmentos religiosos, além das reivindicações dos produtores rurais e dos proprietários com títulos oficiais emitidos há décadas. Some-se a isso o fato de que grande parte da reserva constitui área de fronteira, ameaçando a soberania nacional.
A Justiça Federal de Roraima, por meio de comissão de peritos, detectou inúmeras fraudes no laudo antropológico que serviu de base para a homologação, que vão desde motoristas assinando como técnicos agrícolas até o aumento injustificado da área, unindo as comunidades da Raposa (ao sul) e da Serra do Sol (ao norte), que ficam a quase 200 quilômetros de distância uma da outra, além de serem de etnias diferentes. Além disso, o mesmo laudo foi tomado como base para justificar tanto a demarcação contínua quanto a não contínua, permitindo interpretações subjetivas.
Ademais, há. Tais interpretações vêm sendo desprezadas pelos sucessivos laudos antropológicos. Soma-se a isso o grave problema social gerado pela forma excludente da demarcação, desterrando mais de 400 famílias que vivem ali há décadas, em sua grande maioria miscigenada. Há casos inclusive de famílias que foram divididas pelo apartheid social e étnico gerado pela decisão do governo federal.
No entanto, está claro que não haverá solução definitiva e pacífica até que o Supremo Tribunal Federal julgue as ações que tramitam naquela corte. A solução está em buscar uma proposta que respeite a soberania nacional e o direito à autonomia de todas as tribos indígenas da área Raposa Serra do Sol, garantindo as condições para o contato fraterno entre os povos Ingarikó, Makuxi, Patamona, Taurepang e Wapixana e a população não índia, mestiça ou cabocla e outros brasileiros.
(Correio Braziliense, 02/06/2008)
Um comentário:
Srs.
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leiam a opinião do blog, bem como dos leitores dele, sobre o VERDE-MELANCIA!
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