Tá tudo dominado?
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Mais poder para Jobim
Manobra feita no orçamento tira autonomia financeira das Forças Militares
e garante à Defesa maior poder sobre Marinha, Exército e Aeronáutica
Lúcio Lambranho
Os comandantes militares, que têm a rígida disciplina e o respeito à legislação vigente como pilares de sustentação das Forças Armadas, terão de conviver a partir do ano que vem com um "drible" jurídico e político do ministro da Defesa, Nelson Jobim, na proposta de orçamento da pasta para 2008.
Contando com a força política dada pelo presidente Lula desde que assumiu o cargo em meio ao caos aéreo e com a justificativa de padronizar o reaparelhamento das três Forças, Jobim conseguiu fazer com que o Congresso desconsiderasse, entre outras normas orçamentárias, a lei complementar que definiu, ainda em 1999, a organização da Marinha, do Exército e da Aeronáutica.
Controle sobre licitações
A manobra vem embutida na Emenda 60020001, já aprovada no relatório setorial da Defesa na Comissão Mista de Orçamento. Caso o Congresso a aprove definitivamente em fevereiro, quando será votada a proposta orçamentária, o ministro terá sob sua caneta todas as licitações para compra de armamento e equipamento dos três comandos militares.
A estratégia conta, inclusive, com o aval da oposição, que comanda a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado. A pedido de Jobim, o colegiado assumiu a emenda que dribla a lei que regula a distribuição de verbas entre os comandantes militares. O relator setorial da área, senador Sérgio Zambiasi (PTB-RS), e os integrantes da Comissão Mista de Orçamento ignoraram os pareceres apresentados pelos técnicos que condenavam a alteração orçamentária.
A Lei Complementar 97/99 determina no seu capítulo de orçamento que "a Marinha, o Exército e a Aeronáutica farão a gestão, de forma individualizada, dos recursos orçamentários que lhes forem destinados no orçamento do Ministério da Defesa".
A lei foi sancionada no mesmo ano em que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso criou o Ministério da Defesa e retirou de vez os comandantes militares da sala de despacho da Presidência da República e das discussões políticas do Executivo.
Créditos suplementares
Com um pedido de R$ 1,5 bilhão, mas contemplada pelo relatório setorial com apenas R$ 10 milhões, a emenda será a porta de entrada para créditos suplementares já acertados com a equipe econômica.
"Eu não conheço país nenhum do mundo, que queira ser respeitado, que não tenha Forças Armadas altamente equipadas e altamente preparadas. Ninguém respeita um país que não se respeita", disse o presidente Lula (SIC) durante o almoço com os comandantes militares, na última terça-feira (11), no Clube Naval em Brasília.
Na ocasião, o presidente prometeu novamente reaparelhar as três Forças e revelou que Jobim e o ministro da Secretaria de Planejamento de Longo Prazo da Presidência da República, Mangabeira Unger, trabalham num “plano de recuperação” das Forças Armadas, a partir da recuperação da indústria de defesa.
A situação nos quartéis é considerada calamitosa por especialistas no setor, principalmente no que se refere ao sucateamento do material bélico das três Forças. Entre 2001 e 2002, últimos anos da gestão Fernando Henrique Cardoso, a pasta da Defesa fez investimentos de R$ 6,1 bilhões. Em seus primeiros quatro anos, o governo Lula investiu apenas R$ 600 milhões a mais, ou seja, cerca de R$ 6,7 bilhões.
Dos R$ 44,3 bilhões já aprovados pelo relatório setorial na Comissão Mista de Orçamento para 2008, 86,65% estão destinados a cobrir gastos com pessoal e encargos sociais, além das chamadas despesas correntes.
Retirada de autonomia
Mas o drible legal ao orçamento pode ter sido em vão, caso a equipe econômica não cumpra a promessa de liberar crédito suplementares, principalmente após a derrubada da CPMF no Senado. O valor é irrisório frente a uma estimativa de investimento de R$ 14,6 bilhões feita pelos próprios comandantes militares.
O que Jobim pretende agora – o que já tinha sido tentado pelo ex-ministro e vice-presidente José Alencar, em emenda semelhante aprovada no orçamento de 2005 – é retirar a autonomia orçamentária e financeira de investimento dos generais comandantes.
A emenda de 2005, que abriu o precedente na Comissão Mista de Orçamento, foi aprovada com destinação de R$ 29 milhões, mas só teve pagamento de R$ 12 milhões.
Militares ouvidos pelo Congresso em Foco sob a condição de não serem identificados disseram à reportagem que a emenda foi uma alternativa para ampliar o orçamento da Defesa. Apesar de considerarem que, com a mudança, os comandantes não vão ficar exatamente "de joelhos" diante de Jobim, eles admitiram que a solução deveria ter sido feita com a alteração da lei complementar, assim como preza a boa conduta nas casernas.
Confrontando a LDO
A emenda da comissão presidida pelo senador Heráclito Fortes (DEM-PI) também contraria a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). A regra prevista na LDO determina que os créditos devem ser alocados nas unidades orçamentárias responsáveis pela execução das ações, ou seja, os Comandos da Marinha, do Exército e da Aeronáutica.
Além disso, o Projeto de Lei do Plano Plurianual 2008-2011 prevê, no seu artigo 11, que "todo projeto de grande vulto deverá constituir projeto orçamentário específico e discriminado, no nível de título, vedada sua execução à conta de outras programações”. Nesse caso, uma emenda genérica, do tipo “guarda-chuva”, não poderia ser usada para o reaparelhamento das três Forças.
E não é só isso. A Resolução nº1, de 2006, do Congresso Nacional, estabelece que as emendas propostas pelas comissões permanentes não podem contemplar programações genéricas que abranjam obras distintas.
Todos esses impedimentos legais, que foram alertados inclusive pela assessoria do Senado, não foram suficientes para convencer o presidente da comissão do Senado e autor da emenda, senador Heráclito Fortes. "Demos as condições para o ministro trabalhar. Não é justo que o Ministério da Defesa não tenha orçamento", argumenta o senador da oposição. "Eu tenho que pensar num Ministério da Defesa para o Brasil", completa Heráclito.
Matando no peito
O relator setorial dos ministérios da Defesa e da Justiça, senador Sérgio Zambiazi, admite ao Congresso em Foco que a emenda sofreu mesmo resistência entre os técnicos do orçamento, mas que um "entendimento" foi construído pelo Comitê de Admissibilidade da Comissão Mista de Orçamento.
Por força desse acordo político, referendado pelo ministro da Defesa, o Comitê não chegou nem a mencionar a emenda entre as que tinham problemas relacionados com as novas regras da Resolução nº1 e a LDO.
"Pela primeira vez, os comandantes militares explicitaram em audiência pública na comissão a verdadeira situação das Forças Armadas. Antes eles estavam matando no peito em respeito à hierarquia e à disciplina. Essa emenda é um bom avanço considerando que existe equipamento ainda da 2ª guerra mundial nas três forças", avalia o senador do PTB.
Oficialmente, o Ministério da Defesa respondeu ao site (leia a íntegra) que o objetivo da emenda é “complementar os recursos alocados aos programas de reaparelhamento das Forças Armadas, principalmente para viabilizar investimentos, cuja decisão e execução devam obedecer às prioridades estabelecidas para o conjunto das Forças Armadas".
Sem considerar os pontos de conflito com a lei complementar, o ministério defende a emenda alegando que é possível "obter economias orçamentárias significativas em função de maior escala de aquisições".
Distorção
Apesar dos argumentos do Ministério da Defesa, técnicos do orçamento disseram ao site que a emenda abre um precedente grave, pois distorce o orçamento feito para que as emendas contemplem apenas uma ação como necessária para o reaparelhamento das Forças Armadas.
O argumento é de que a colocação de créditos diretamente na unidade orçamentária responsável pela execução das ações, ao contrário do que está sendo proposto, previne desvios e dá mais transparência à gestão do orçamento.
quinta-feira, 20 de dezembro de 2007
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