Notícias Militares

quarta-feira, 22 de abril de 2009

BRASIL SEC XX - 4




BRASIL SEC XX - 4
DA PERIFERIA A POTÊNCIA EMERGENTE




Ternuma Regional Brasília
Agnaldo Del Nero Augusto – General de Divisão Reformado

A Guerra Civil na Rússia é geralmente analisada como um conflito entre os Vermelhos (bolcheviques) e os Brancos (monarquistas). Na realidade, além dos confrontos militares entre os dois exércitos, mais importante foi o que se passou atrás dessas linhas de frente em incessante movimento. Essa dimensão da guerra civil é conhecida como “fronte interior”. Ela se caracteriza por uma repressão multiforme exercida pelos poderes estabelecidos, branco ou vermelho. A política de terror bolchevique foi sistemática, mais organizada, pensada e posta em prática como tal muito antes da guerra civil, teorizada contra grupos inteiros da sociedade – sendo sua repressão muito maior e mais frequente contra: os militantes políticos dos partidos e grupos de oposição; contra os trabalhadores em greve por alguma reivindicação; contra os desertores que fugiam da convocação militar ou de sua unidade, ou simplesmente contra os cidadãos pertencentes a uma classe social suspeita ou ‘hostil’. Uma das primeiras incursões armadas da Polícia Política bolchevique foi o ataque aos anarquistas de Moscou, em abril de 1918, com dezenas de pessoas executadas de imediato.
Foi apropriadamente designada como “Guerra Suja” no Livro Negro do Comunismo, que lhe dedica dois itens: o 3. O Terror Vermelho e o 4. A Guerra Suja (Pg 90/102)
O novo poder tinha três faces:
- uma fachada, “o poder dos sovietes”;
- um governo legal, o Conselho dos Comissários do Povo;
- uma organização revolucionária, o Comitê Militar Revolucionário de Petrogrado (CMRP), a estrutura operacional central do dispositivo de tomada do poder.
Feliks Dzerjinski, que desempenhou papel decisivo no CMRP, seria o dirigente da Comissão Panrussa Extraordinária de Luta Contra a Contra-Revolução, que entraria para a história com as iniciais Vetcheka, ou simplesmente Tcheka, a polícia política bolchevique, o braço armado da Ditadura do Proletariado e que, posteriormente, abarcaria as funções do CMRP.
No verão de 1918 surgiram dezenas de revoltas e insurreições, as mais freqüentes devidas a comunidades camponesas que se recusavam a cumprir as exageradas requisições de suas colheitas, cujo resultado já abordamos no 30 artigo que, cronologicamente, deveria vir após este.
Em 9 de agosto de 1918 Lênin telegrafou ao presidente do Comitê Executivo do Soviete de Nijni-Novgorod, que acabara de informar sobre incidentes implicando camponeses protestando contra as requisições: “É preciso formar imediatamente uma ‘troika’ ditatorial (composta por você e [...]), introduzindo imediatamente o terror de massa, fuzilar ou deportar as centenas de prostitutas que dão de beber aos soldados, todos os ex-oficiais etc. Não há um minuto a perder [...] É necessário agir com decisão: prática em massa de buscas; execução por porte de arma; deportação em massa de mencheviques e outros elementos suspeitos. No dia seguinte Lênin enviou telegrama ao Comitê Executivo do Soviete de Penza: Camaradas! O levante kulak nos cinco distritos de sua região deve ser esmagado sem piedade. Os interesses de toda a revolução o exigem. É necessário dar o exemplo:
1)Enforcar (e digo enforcar de modo que todos possam ver) não menos de 100 kulaks, ricos e notórios bebedores de sangue. 2) Publicar seus nomes 3) Apoderar-se de todos os seus grãos [...] Façam isso de maneira que a cem léguas em torno as pessoas vejam, tremam, compreendam e digam: eles matam e continuarão a matar[...] Telegrafem em resposta dizendo que vocês receberam e executaram exatamente estas instruções. Seu Lênin.
Nesse mesmo dia, em outro telegrama a esse mesmo Comitê pedia que fossem “aprisionados os padres e outros elementos duvidosos num campo de concentração”. Os campos de concentração eram campos de internação onde deveriam ser encarcerados, através de uma simples medida administrativa e sem qualquer julgamento, os elementos duvidosos. Entre os ‘elementos duvidosos’ a serem preventivamente aprisionados figuravam, em primeiro lugar, os responsáveis políticos, ainda em liberdade, dos partidos de oposição.
Em poucos dias, essas manifestações foram ferozmente reprimidas pelos destacamentos mais confiáveis do Exército Vermelho ou da Tcheka. Apenas a cidade de Yaroslav, onde os destacamentos de Savinkov (dirigente socialista-revolucionário) haviam deposto o poder bolchevique local, resistiu cerca de 15 dias. Após a queda da cidade, Dzerjinki enviou a Yaroslav uma ‘comissão especial de investigação’, que, em cinco dias, de 24 a 28 de julho de 1918, executou 428 pessoas.
Durante o mês de agosto de 1918, ou seja, antes do desencadeamento “oficial” do Terror Vermelho de 3 de setembro, os dirigentes bolcheviques, com Lênin e Dzerjinski à frente, enviaram dezenas de mensagens aos representantes locais da Tcheka e do Partido, pedindo-lhes que “tomassem medidas profiláticas para a prevenção de toda tentativa de insurreição “. Entre essas medidas explicava Dzerjinski, “as mais eficazes são a tomada de reféns entre os burgueses, a partir das listas que vocês estabeleceram para as contribuições excepcionais exigidas dos burgueses [...] a detenção e o encarceramento de todos os reféns e suspeitos em campos de concentração”.
Dia 8 de agosto, Lênin pediu a Tsuriupa, Comissário do povo para o Abastecimento, que redigisse um decreto segundo o qual “em cada distrito produtor de cereais, 25 reféns, escolhidos entre os habitantes mais abastados, pagarão com suas vidas pela não realização do plano de requisição.
Em 30 de agosto houve dois atentados, um deles dirigido contra Lênin. Este último atribuído a Fanny Kaplan, uma militante próxima dos meios anarquistas. Detida, foi executada, sem julgamento, três dias depois do fato.
Artigos publicados na imprensa e declarações oficiais estimulavam o crescimento do terror: “Trabalhadores”, escrevia o Pravda de 31 de agosto, “é chegada a hora de aniquilar a burguesia [...] As cidades devem ser impecavelmente limpas de toda putrefação burguesa. Todos que representarem qualquer perigo para a causa revolucionária, exterminados [...] O hino da classe operária será um canto de ódio e de vingança”.
No mesmo dia, Dzerjinski, redigiu uma "Convocação à classe operária” com o seguinte espírito: “ Que a classe operária esmague, através do terror de massa, a hidra da contra-revolução! Que inimigos da classe operária saibam que todo indivíduo detido com a posse de uma arma será executado, que todo indivíduo que ouse fazer a menor propaganda contra o regime soviético será encarcerado num campo de concentração”. Havia outro tipo de campo de concentração, o de trabalho coercitivo, onde eram internados aqueles que haviam sido condenados por um Tribunal revolucionário e que seriam utilizados como mão de obra escrava pela Rússia. As pessoas passaram a cumprir penas não pelo que fizessem, mas, particularmente, pelo que fossem.
Trotski, Comissário do povo para a Guerra, dirigindo-se aos delegados do Comitê Central dos Sovietes, previu: “Em menos de um mês, o terror, do mesmo modo que ocorreu durante a Grande Revolução francesa, vai ganhar formas bastante violentas. Não será mais somente a prisão, mas a guilhotina – essa notável invenção da Grande Revolução francesa que tem como a maior vantagem reconhecida a de encurtar o homem em uma cabeça – que estará pronta para os nossos inimigos”.
Em novembro foi criada uma Comissão para o Abastecimento, cuja primeira proclamação acusava as “classes ricas que se aproveitavam da miséria” e afirmava: “É chegada à hora de requisitar todo o excedente dos ricos, e também, por que não? seus bens”. A Comissão para o Abastecimento decidiu enviar, imediatamente, destacamentos especiais às províncias produtoras de cereais, “afim de obter os produtos de primeira necessidade”. Essa medida tomada por uma comissão do CMRP prefigurava a política de requisição que seria praticada durante cerca de três anos e a razão dos confrontos entre o novo poder e os camponeses, com a consequente geração de violência e terror.
Os poucos episódios narrados neste artigo não cobrem o terror que vinha gerando os procedimentos engendrados pelos bolchevistas para alcançar o poder absoluto, que buscavam, além de resguardar a revolução. Nem era nosso objetivo e pretensão fazê-lo no curto espaço de um artigo. Todavia, no próximo, exporemos dois episódios significativos, que permitem complementar a percepção desse terror e dos mecanismos de controle empregados pelos bolchevistas.

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