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quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

SISTEMA ELEITORAL NORTE - AMERICANO


PARA ENTENDER O SISTEMA ELEITORAL NORTE-AMERICANO

30/01/2008 | Paulo G. M. de Moura


O sistema eleitoral norte-americano é único no mundo, tanto por sua forma como por sua complexidade. O observador externo que acompanha a cobertura jornalística do pleito em curso pela televisão, certamente terá dificuldade para descobrir os meandros de um sistema com tamanhas especificidades.

Uma dessas especificidades é a realização de um processo em duas fases. Na primeira etapa, em curso nesse momento, ocorre uma espécie de pré-escrutínio em todos os 50 estados, tanto no Partido Democrata como no Republicano. Os candidatos de cada partido são escolhidos de formas diferentes em cada estado, pois a federação de estados norte-americanos formou-se sob circunstâncias segundo as quais a legislação local, no caso, eleitoral, é que define o processamento das escolhas.

Há duas formas de os partidos norte americanos processarem a escolha de seus candidatos. Um delas é a chamada “eleição primária” mediante voto em urna. A outra é o “caucus”. O caucus é uma assembléia de eleitores que se reúnem em escolas, igrejas, residências ou próprios públicos, conforme os distritos eleitorais. Nessas reuniões os candidatos se apresentam com suas propostas e os eleitores presentes elegem os delegados às convenções partidárias nas quais, por sua vez, são escolhidos os nomes que concorrerão ao governo pelo respectivo partido.

A definição da lista dos postulantes à condição de candidatos de um partido ocorre pela coleta de assinaturas de membros da organização partidária em número que varia conforme o tamanho da circunscrição eleitoral. Esse procedimento oferece às minorias partidárias mecanismos de proteção contra facções dominantes. De outra forma as maiorias poderiam impedir o acesso das facções minoritárias à possibilidade de apresentar pré-candidatos aos eleitores.

Esses mecanismos foram desenvolvidos nos EUA no princípio do século XX para reduzir a influência dos dirigentes partidários sobre a escolha dos candidatos, reduzindo o peso da “máquina” sobre esses processos de decisão coletiva. De fato, o mecanismo das eleições primárias implicou na democratização do método de escolha dos candidatos, forçando uma mudança na forma através da qual os dirigentes influenciam esse tipo de decisão nos partidos.

Importante ressaltar que, se por um lado o mecanismo das primárias remete ao eleitor a arbitragem sobre os conflitos e rivalidades internos aos partidos, por outro, ele pressupõe a necessidade de que os partidos garantam ampla participação, pois, em caso contrário, restringe-se muito a significação da escolha através desse tipo de procedimento.

Uma lei estadual define que New Hampshire, que foi primeiro estado a deliberar por plebiscito a adesão à União, seja também o primeiro a realizar uma eleição primária. No entanto, uma lei, também estadual, define que Iowa deva ser o primeiro a ter qualquer tipo de votação. Por isso, em casos em que a escolha ocorre primeiro em Iowa, o método é o caucus, contornando o conflito com New Hampshire, que, então, escolhe por eleição primária com voto em urna.

Nos caucus do Partido Republicano as votações se processam informalmente, com os eleitores levantando a mão nas reuniões. Sai vencedor o candidato com maior número de votos. Já no Partido Democrata o processamento da escolha é mais complicado. Os pré-candidatos precisam alcançar 15% dos votos em todos os distritos eleitorais para permanecerem na disputa, caso contrário, são eliminados. Nesses casos ocorre nova votação, apenas com os candidatos remanescentes. Dessa nova disputa sai o pré-candidato que fizer a maioria dos delegados dos distritos eleitorais que, por sua vez, votarão nas convenções dos condados. Esses delegados, então, elegem nessas convenções dos condados, outros delegados para votar nas convenções estaduais. Das convenções estaduais, finalmente, saem os chamados superdelegados, que são, de fato, aqueles que elegerão o presidente da República na condição nas convenções nacionais de cada um dos dois grandes partidos.

As primárias, por outro lado, são eleições prévias e internas dos partidos, que também apresentam variações conforme as leis de cada estado. Em ambas as situações, caucus ou eleição primária, há influência dos dirigentes partidários sobre a escolha dos candidatos, variando apenas a dimensão do colégio eleitoral, mais ou menos restrito, que irá designar o(s) escolhido(s) para representar legenda perante o eleitorado em geral. Outra variação importante que pode ocorrer nesses casos é o caráter aberto ou fechado da escolha. Isto é, a eleição de um candidato pode ocorrer em âmbito interno e de forma fechada ao partido, para preservar a organização e seus candidatos da exposição pública de suas divergências. Ou, pode ser eleição aberta, com o partido assumindo seu caráter oficial e público.

Por essa via os partido escolhem delegados às convenções que escolherão os candidatos aos cargos majoritários. Em alguns estados a lei permite a participação de eleitores e simpatizantes sem vínculo partidário nas primárias, caso em que, inclusive a disputa assume as características de uma verdadeira eleição preliminar. Nesses casos a definição do pré-candidato vencedor também é indireta. Isto é, nas primárias são eleitos os delegados à convenção nacional, arena na qual se define o candidato do partido. Os eleitos, por sua vez, elegem outros delegados às convenções nacionais conforme a proporção de votos recebidos nas primárias.

Nas primárias fechadas, somente podem participar eleitores do próprio partido. Para participar da eleição primária de um partido o interessado precisa se “matricular” como eleitor dessa legenda através de um mecanismo chamado registration, pelo qual a pessoa declara o partido ao qual pretende se cadastrar para a primária, decisão que somente pode ser alterada na próxima registration. Pode ocorrer, ainda, a matrícula na entrada do posto eleitoral, onde o eleitor recebe uma cédula do partido que escolheu, sendo que o prazo para modificar a filiação para a primária seguinte pode variar entre um intervalo de seis meses a dez dias, conforme o estado. Há estados em que o acesso à primária é mais restrito, exigindo dos participantes prova de fidelidade através de declarações expressas de apoio (challenge).

Esse mecanismo não deve ser confundido com o procedimento de filiação que pressupõe um vínculo mais sólido com a organização partidária, incluindo não apenas a participação nas prévias, mas também a contribuição financeira regular; a participação na vida do partido e a influência nas suas decisões e na escolha de seus dirigentes, o que não é exigido dos eleitores e simpatizantes que participam das prévias matriculando-se no partido.

Nas primárias abertas é preservado o segredo das preferências políticas do eleitor, que não é obrigado a explicitar sua inclinação partidária. Nesse caso o eleitor recebe duas cédulas na entrada do posto eleitoral, uma de cada partido; ou ainda, uma cédula com duas colunas, contendo a lista dos candidatos de cada legenda, marcando uma cruz ao lado dos nomes que prefere, devendo o eleitor utilizar apenas uma das cédulas, ou deixar em branco a coluna de um dos partidos sob pena de anulação do voto.

No início do processo a imprensa noticia os resultados dos estados, sem que, em geral, seja possível antecipar o resultado final do processo. Alguns nomes que não conseguem se viabilizar nessa etapa podem desistir e declarar apoio a outros nomes que seguem na disputa. Além das votações na largada, outro momento importante e a chamada “super terça-feira”, dia em que 22 estados votam simultaneamente, produzindo como resultado um cenário mais claro e próximo da com figuração final das convenções.

Superada a primeira fase da disputa em todos os estados, tem início, com a realização das convenções nacionais de cada partido, a segunda etapa do processo. Nessas convenções reúnem-se todos os delegados indicados pelas convenções estaduais. Por isso, esses representantes são chamados de “superdelegados”. Os superdelegados, em geral, são dirigentes partidários que, de fato, podem votar com razoável grau de liberdade. A retrospectiva indica que tendem a votar no nome do favorito. O eleito tende a prosseguir na disputa presidencial concorrendo contra o candidato do partido adversário. Aqui começa o que se conhece, fora dos Estados Unidos, como a eleição presidencial de fato.

Definidos os candidatos dos dois grandes partidos começa a etapa final da eleição. Nessa fase podem se apresentar candidatos independentes. É nesse momento que ocorre o confronto direto entre os candidatos Democrata e Republicano, através dos debates; de campanha publicitária e da abordagem direta dos eleitores pelos concorrentes e suas estruturas de campanha, nas ruas de cada estado.

No dia 4 de novembro os eleitores vão às urnas para eleger os delegados que integram um colégio eleitoral. Os eleitores norte-americanos, portanto, escolhem o presidente de forma indireta, pois, de fato, votam nos “eleitores” de um dos candidatos. Os delegados apresentam-se aos eleitores como “cabos eleitorais” de um candidato. O cidadão que quer votar num determinado candidato para presidente, deve votar num delegado comprometido com esse candidato para que o delegado, então, leve seu voto ao colégio eleitoral.

Finalmente, mais uma particularidade. Cada estado norte-americano conta com um número definido de delegados ao colégio eleitoral, conforme seu número de habitantes. O candidato vitorioso num estado leva todos os delegados desse estado ao colégio eleitoral. Por essa regra podem ocorrer situações como a da eleição presidencial do ano 2000, na qual George W. Bush se elegeu escolhido por um número maior de delegados, embora Al Gore tenha feito mais votos de eleitores.

O resultado pode ser explicado pela regra do sistema, conforme a situação hipotética a seguir. Imaginemos que um estado determinado possa enviar 31 delegados ao colégio eleitoral, e que, nesse estado, o candidato A vence com 50,1% dos votos. O candidato B, derrotado nesse estado, portanto, terá angariado 49,9% dos votos. Pela regra, o candidato A leva à convenção o total de votos dos 31 delegados estaduais.

Agora imaginemos que o estado vizinho tenha direito a enviar 30 delegados ao colégio eleitoral e que nesse estado o candidato B vença fazendo 85% dos votos. Nesse caso, o candidato A, vencedor no caso anterior, terá feito apenas 15% dos votos. O candidato B, vencedor nesse segundo estado, levará 30 votos à convenção nacional. Nesse caso a fórmula determina que o candidato eleito seja A, pois esse terá feito 31 delegados à convenção nacional, contra 30 do candidato B. Isso, mesmo que o candidato B tenha mais votos junto aos eleitores.

O quadro abaixo apresenta uma síntese do processo como um todo.

1. Cada partido faz seus caucus ou primárias, conforme a lei local.
2. O pré-candidato vencedor terá um determinado número de delegados na convenção nacional do seu partido.
3. Na convenção nacional é escolhido candidato aquele que obtiver o maior número de votos de delegados.
4. Candidatos republicano e democrata fazem campanha pública.
5. Cada estado elege um número pré-fixado de delegados para o colégio eleitoral.
6. O candidato vitorioso no estado leva os votos de todos os delegados.
7. Elege-se presidente o candidato que obtiver mais de votos de delegados no colégio eleitoral.

Fontes:
Duverger, Maurice. Los partidos Politicos. Fondo de Cultura Económica. México. 1951.

Um comentário:

Anônimo disse...

Esse sistema eleitoral é muito complicado,prefiro o nosso.